Profundidade no meu anime, de Madoka a Hatenkou Yuugi

"Sou Doutor em Filosofia, vi e entendi Evangelion."

Porque tudo começou, como sempre, com Puella Magi Madoka Magica. Pra começar, já digo que não vou traçar nenhum paralelo direto com Madoka aqui, simplesmente porque eu nunca terminei de assistir. Vi até o episódio 8 ou 9, parei porque realmente não fazia diferença, e não tive saudades o bastante pra voltar. Vi muitas pessoas pirando com o final, mas àquela altura eu já tinha parado de ver há um tempo e nem lembrava bem o que acontecia, porque os acontecimentos não eram memoráveis o bastante. Não quer dizer que o anime não seja "profundo" ou sei lá - pelo contrário, me lembro vagamente de estranhar garotinhas do ensino fundamental conversando sobre o sentido da vida no telhado da escola - mas sim que, pessoalmente, não me atingiu.

Certo, dito isso, eu sei que Madoka tem sido cultuado como o-grande-anime-de-profundidade-imensurável-do-ano. E é sobre isso o rant. "Isso" sendo: animes de profundidade imensurável que falham em entreter, o que diabos as pessoas veem neles, a receita do bolo, os segredos do universo e... Hatenkou Yuugi!
 




Hatenkou Yuugi, também conhecida (pffft) no Ocidente como Dazzle, é uma série de mangá, anime, e provavelmente só isso (nunca rendeu muito dinheiro, o que é triste!) serializada desde 1999, inicialmente na revista GFantasy - sabe, aquela que diz que é shounen e publica, tipo, Kuroshitsuji - e atualmente na Comic Zero Sum - que publicou, tipo, Loveless e 07-Ghost. É. (E que eu fui olhar pra ter certeza de que era shoujo, e pirei quando li que é, e maioria dos editores-chefes são homens - tipo, Sekaiichi Hatsukoi! Aliás, eu tenho que escrever sobre um dia... Hã, voltando pro post.) De qualquer forma, é uma série tão famosa que é publicada há 12 anos, tem um anime de 10 episódios, e você nunca deve ter ouvido ninguém falar sobre... até agora.

A história é mais ou menos a seguinte: tem essa garota que vive uma vida normal. Um belo dia, o pai resolve chutá-la de casa sem motivo aparente, e ao invés de chorar e se matar, ela decide ir viver aventuras legais e empolgantes. Ela conhece dois caras legais e bonitos que resolvem acompanhá-la. E o mundo é uma grande orgia. Não, sério, é mais ou menos isso. É retardado? Bastante. As pontas soltas estão em todos os cantos, principalmente no anime, e isso é o bastante pra que a maioria das pessoas digam "não gostei, tchau". Mas não Mimi Bunny! Eu disse que gosto de procurar pela magia que as coisas ruins escondem, certo? E assim eu fui assistir Hatenkou Yuugi. Porque afinal, tem que ser uma magia muito especial pra fazer um mangá com um traço mais tosco que o meu durar 12 anos.

Sério, olha esse traço. Devia ser um crime ser tão detalhado e tão ruim ao mesmo tempo.

E o que eu descobri foi um mangá que, com algum refinamento em aspectos primários, podia ser bem famoso. Não vou nem colocar meu bias de fã aqui, mas a coisa é que Hatenkou Yuugi transparece muita dedicação. É como se o autor, pra cada boa ideia que ele tivesse, pensasse "ei, quero colocar isso na minha história", sabe? Volta e meia você é surpreendido por alguma frase significativa jogada em um painel facilmente ignorável. A dinâmica entre os personagens se torna cada vez mais interessante, a série tem uma comédia legal, e consegue entreter sem precisar narrar a Odisséia pra isso. Não digo que Hatenkou Yuugi tenha mudado a minha vida, mas me deixou curiosa o bastante pra pesquisar sobre albinismo e explosões com farinha, e eu não sou de pesquisar nem matéria da faculdade. Quer dizer... eu estou escrevendo um post sobre o anime. Significa que eu realmente me importei.

Então, voltando ao ponto inicial, as obras-primas da animação japonesa. A ideia do post começou com um rant imenso no Twitter. Resumindo, me perturba o quão simples é fazer uma obra-prima. E como elas são cultuadas pela suposta "profundidade" e "ideias inovadoras" que têm, e não por uma estratégia comercial bem-sucedida. Ideias inovadoras por si só não vendem, e é claro que é totalmente justo elogiar uma obra por ter conseguido o sucesso comercial que todas buscam, mas ser bem planejado não significa ser inteligente, impactante, ou, sobretudo, divertido.

Isso me lembra da questão do fanservice que eu vi ser discutida eras atrás em blogs de anime. Fanservice, apesar de ter uma conotação erótica, se refere aos aspectos da obra que são feitos unicamente com a intenção de apelar pro espectador. E nesse sentido, o que mais tem nessas obras-primas é fanservice. Não adianta dizer que eu estou mentindo, que "______ não tem fanservice oh meu deus você não entende a profundidade da significação do bla bla bla whiskas sachê", o ponto é que o autor não jogou aquelas coisas ali porque ele queria transmitir uma mensagem, mas sim porque ele sabia que ia te fazer se sentir intelectual.




Pra exemplificar, posso falar de Neon Genesis Evangelion. Evangelion é uma das poucas séries do tipo que eu gosto. Vi, li discussões, comecei o mangá, estou esperando pra sempre a Edição Definitiva que a Conrad um dia pretendeu lançar, e uma oportunidade de comprar os Blu-Rays da Paris Filmes. Acho bem montado, acho que tem uma atmosfera peculiar, mas, ei, segredo (ou não muito): a primeira vez que eu vi foi um saco. De vez em nunca tinha um momento "oh!" que eu guardei na memória, mas no geral foi bem... sem graça e repetitivo. O drama do Shinji perdeu a graça na primeira meia dúzia de episódios, sério. Então eu pensei, devo ser louca, certo? E fui procurar, e descobri muita gente que também se sente assim, mas meio que não tem voz no meio de tanto hype.

Acontece que o final foi inesperadamente incrível e pretensioso. E aí as pessoas reagiram, se revoltaram, fizeram barulho, vieram as continuações, os remakes, o culto, a gente sabe como é. Porque oh meu deus, ele usou um plano de fundo vazio e falou de Schopenhauer, claramente isso é genial!

Hã... Isso é genial... Certo?



Parabéns! Você se vendeu!


Mas sim, mesmo não sendo um dos meus animes preferidos, eu gosto do universo de Evangelion. Porque é bem montado, e algumas partes tem essa coisa de sentimentos-do-autor que cativa. Isso não significa que eu tenha me sentido lá muito entretida enquanto estava vendo, ou que tenha tido muitas partes memoráveis... e no fim das contas, anime é uma forma de entretenimento. Deu pra entender onde eu quero chegar. Evangelion não teria sido genial se não tivesse tido um fim apelativo e dois ou três conceitos de filosofia e psicologia popular ampliados ao máximo com purpurina em cima. Mas como teve, é incrível, intelectual, e toda aquela coisa de meu-gosto-é-melhor-que-o-seu.

O mesmo vale pra 90% dos animes que são cultuados de uma maneira geral como algo grandioso, maravilhoso e etc. E é por isso que eu realmente não ligo mais, e é por isso que eu não terminei Madoka, nem pretendo terminar. E é por isso que eu cansei enquanto escrevia sobre Evangelion. É, é bom. Mas não é nenhum Hatenkou Yuugi.


Mais genial que Evangelion. Melhor que Pica-Pau.


Em síntese: Sabe aquele anime que você gosta porque é genial, mas não sentiu nada especial assistindo? Talvez ele não seja tão genial assim. Ainda: Todos deviam ver Hatenkou Yuugi. E por fim: "Bunny é a indústria, Kotetsu é a cultura". (@pedrowzee, às 5 da manhã de uma quarta-feira, num momento de insight. Várias interpretações, minha favorita: "A indústria devia ceder pra cultura e não o contrário, parem de forçar").
Abraços.

1 comentários:

Spider-Phoenix disse...

Acabei entrando nesse blog por acaso, mas quero parabenizar por este post.

Concordo totalmente com este ponto de vista. A meu ver, enquanto é legal saber que uma produção nérdica traga uma história com algum significado, é muito melhor acompanhar uma obra de ficção pelo simples aspecto da diversão.

E, tipo, é muito irritante saber que quando você gosta de uma determinada série, você é taxado disso ou daquilo simplesmente porque ela não está na lista de "séries postas no pedestal da suprema superioridade" ou não é como a série x que é "o supra sumo da existência humana". As vezes parece que tem gente que só acompanhar ficção para procurar/conseguir algo que julga não ter ao invés de simplesmente se divertir.

Quanto a Madoka não assisti, mas o pouco que eu li não me pareceu motivo para tanto barulho, ainda mais com essa modinha de "desconstruir tudo para pagar de cool, descolado e inteligente".

Bem, é isso. Parabéns pelo blog.

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